Desde o início dos anos 90 o número de organizações não-governamentais vem se multiplicando a cada ano. Sabe-se hoje que o Brasil é um dos países com o maior número de ONGs. O aumento de ações relacionadas à Responsabilidade Social Empresarial e Voluntariado também já é significativo.
Nenhum setor isoladamente tem capacidade para mudar a cara do Brasil. Todos os setores (poder público, setor privado, terceiro setor) refletem as tensões e conflitos presentes em nossa realidade e, assim, podem tanto portar valores de mudança quanto fortalecer tendências que reproduzem a injustiça e a desigualdade que marcam o país. Atualmente, vivemos uma era de mudanças e incertezas, na qual a riqueza, o desenvolvimento e a tecnologia coexistem com a violência, a desigualdade e a exclusão social. Nesse cenário, o crescimento do terceiro setor pode ser compreendido como um saudável movimento da cidadania em busca de novos paradigmas de desenvolvimento social. Porém, para que traga efetiva novidade, o emergente terceiro setor não poderá ser apenas um mecanismo de amortecimento dos efeitos da exclusão social, mas precisará estruturar-se para ir além, ajudando a criar condições de emancipação e vida digna para os pobres, promovendo a igualdade de oportunidades e a inclusão social. E isto só será possível se souber atuar em colaboração com os demais setores, evitando perceber-se como segmento privilegiado ou panacéia para a solução de problemas sociais. É claro que a prática colaborativa não exclui a iniciativa de pressionar os demais setores para que atuem com responsabilidade social.
O voluntariado é um fenômeno que pode estar passando por um processo de reconstrução, no qual a antiga filantropia assistencial vai sendo progressivamente substituída por preocupações mais efetivas com a concretização de uma sociedade mais justa. Para os que dizem que a inspiração do voluntariado é sempre assistencialista ou conservadora, vale lembrar a frase de Che Guevara, para quem "o voluntariado é uma escola criadora de consciências". Ocorre que o assistencialismo é algo muito arraigado na cultura brasileira e nas próprias políticas sociais, o que torna sua superação um processo complexo. Para trazer algo realmente novo, o “voluntariado cidadão” precisa articular a assistência indispensável à busca da cidadania emancipatória. Esta seria a grande novidade: a descoberta de que o trabalho voluntário pode ajudar a desenvolver nos pobres competências de compreensão da realidade, auto-sustentação e empreendedorismo. Esse voluntariado será capaz, então, de contribuir para que o terceiro setor se desenvolva como um espaço que pode fortalecer a autonomia das comunidades para resolver seus próprios problemas.
A crise da democracia representativa tem levado alguns analistas a propor a necessidade de "democratizar a democracia". Isto significa, entre outras coisas, a criação de mecanismos de participação pelos quais os cidadãos possam influir mais diretamente na vida pública, para além do voto. As ONGs e entidades sociais permitem esse tipo de participação, especialmente quando alargam seu campo de visão e passam não apenas a assistir pessoas, mas também a propor programas e políticas que devam ser assumidos ou apoiados pelos governos e pela sociedade em geral. As organizações do terceiro setor são portadoras de vários outros valores, entre os quais destaco a capacidade de chegar em locais e públicos em que o Estado muitas vezes não chega: nos segmentos mais esquecidos da sociedade, nas populações mais vulneráveis que, de outra forma, não teriam suas condições de existência, sua voz e suas capacidades reconhecidas e valorizadas.